O Arizona é o único estado dos Estados Unidos continental que não adianta os relógios em uma hora entre março e novembro, período em que vigora o horário de verão no país. O argumento de que os meses de verão são escaldantes e os moradores preferem o fim do dia para aproveitar atividades ao ar livre, mas não querem que isso aconteça às 20 horas com o sol a pino, colou desde 1967.
Eu descobri isso da pior maneira: saí de Utah e cheguei a Page, no Arizona, esbaforido, achando que havia perdido um passeio por estar dez minutos atrasado, quando eu ainda tinha uma hora pela frente. Mas a coisa não é tão simples: existe um enclave no Arizona, pertencente à Nação Navajo, que adere ao horário de verão – e isso pode causar alguma dor de cabeça para quem está viajando. O Antelope Canyon, o destino do meu passeio, fica uma hora à frente de Page, a cidade de onde partem os passeios.
Ainda estamos em Page, que é uma cidade desinteressante, mas guarda em suas cercanias algumas das paisagens mais impactantes do Arizona, como o Upper Antelope Canyon. Agora, uma má notícia: os tons laranja das fotos não são tão perceptíveis a olho nu. Eles são resultado de um efeito polarizador causado pelos grãos de arenito que compõem as paredes – e apenas as lentes das câmeras conseguem captar. É um truque, sim, e dos mais legais.
Os tons de laranja do Upper Antelope Canyon (Simon Morris/Flickr)
O passeio começou na agência Antelope Canyon Tours, no centrinho de Page, onde embarquei com mais 11 pessoas em uma jardineira com tração nas quatro. Saímos da cidade, pegamos a rodovia 98 e chegamos a uma portaria na beira da estrada. Até ali nada indica que o lugar vá surpreender, até porque na sequência o jipe pega um areal e sacoleja muito até estacionar na porta do que parecia ser a entrada de uma gruta.
Logo no primeiro salão, as paredes onduladas, eu diria até rebolantes, impressionam. A incisão na rocha que deu origem ao Antelope foi causada pela força das enchentes que há milhares de anos entram por uma extremidade do cânion, percorrem os 400 metros de salões e saem pelo outro lado. O que a água e também o vento não arrastam, acabam por esculpir.
O cânion está dentro de uma área que pertence aos índios navajo; são eles que guiam os passeios. No meu caso, foi quase um tour fotográfico: “Enquadrem esse lado e vocês terão a foto clássica das revistas”; “Agora pisem aqui”, apontava o guia com uma lanterna; “Enquadrem lá e vocês verão o Taj Mahal”; “Vejam aqui uma múmia, agora um candelabro, um urso, a cara do Abraham Lincoln”, “Não ficou boa a foto? Me dê aqui que eu tiro”.
No verão o passeio é disputadíssimo, então é recomendável reservar com antecedência. Entre abril e setembro o horário mais concorrido é meio-dia, quando os raios de sol penetram pelo topo do cânion e formam uma cachoeira de luz dourada. Algumas agências organizam tours fotográficos nesse período, com duração de duas horas e meia, justamente para captar as variações de cores à medida que a luz percorre as frestas do cânion.
Nem é preciso dizer que essa é a hora do rush no Antelope e pode ficar quase insuportável caminhar pelos salões. Eu embarquei no passeio que saiu de Page às 16h30; fomos o último grupo daquele dia e tivemos o cânion quase só pra gente.
Além do Upper Antelope, existe o Lower Antelope, que é tão impactante quanto e fica do outro lado da rodovia. Se no primeiro as paredes quase se fecham como um triângulo – largo na base e estreito no topo -, o segundo é como um funil, mais aberto no alto e estreito no chão. Enquanto o caminho do Upper é plano de uma ponta a outra, o do Lower é acidentado, tem curvas mais abruptas, escadas em alguns trechos, e, o melhor, é menos muvucado. Os passeios pelo Lower são organizados pelo Ken’s Guided Tour.
O estreito Lower Antelope Canyon (Norbert Eisele-Hein Image Broker / Keystone/Reprodução)
Horseshoe Bend
A sudoeste de Page, outra formação geológica de cair o queixo é Horseshoe Bend. Eu já tinha dado um Google no nome e achado incrível, mas na internet não tem o frio na barriga da vida real. Saindo de Page pela rodovia 89, são apenas 8 quilômetros; basta ficar atento às placas e aos vários carros que surgem estacionados. Parei o meu, devia estar fazendo uns 40 °C, peguei a trilha – são 1 200 metros ida e volta -, com o sol a pino, sem uma sombra que desse um alento.
De repente, na planície à frente, com arbustos baixinhos, surge um rasgo na terra. Só quando estou a poucos metros do abismo é que consigo ver a imagem completa e vertiginosa de uma montanha que irrompe do buraco e que é contornada pela água verde-turquesa do Rio Colorado, formando uma ferradura (daí o horseshoe do nome).
O impressionante Horseshoe Bend (Yay Media AS/Alamy/Reprodução)
Exuberante, estonteante (o lugar merece essas palavras) – tremi nas bases. São poucas as áreas protegidas junto às beiradas e o precipício à frente tem nada menos que 300 metros – crianças devem passar longe.
Lake Powell
Em Page é a natureza que dá o show, mas o homem também fez das suas. Dois prodígios da engenharia, o Lake Powell e a represa Glen igualmente atraem turistas. De longe, o Lake Powell parece uma terra arrasada à beira de um lago, e reside justamente aí o seu interesse. O lugar serviu de locação para as duas versões de Planeta dos Macacos, a mais recente com Mark Wahlberg. Mas o bacana é que suas margens se tornaram uma área de lazer voltada para esportes aquáticos.
Lake Powell (skeeze/)
Na Wahweap Marina está o Lake Powell Resort, um hotel que em tamanho não perde nada para os de Vegas, com a vantagem de ter carrinho de golfe para ir do prédio principal até a marina onde ficam os barcos e um restaurante. As acomodações estão localizadas tanto no hotel como em casas-barco com vários quartos, modalidade muito apreciada por famílias grandes.
O resort organiza passeios de barco pelo lago. O mais longo deles, de seis horas, tem parada em um trecho que pertence a Utah e leva até uma ponte de pedra, a Rainbow Bridge, a qual tem formato de arco-íris e é um lugar sagrado para os índios. Em Page, na briga entre quem faz melhor, se foi a natureza ou se foi o homem, não tem jeito: a natureza sempre sai ganhando.
Estique sua viagem e aproveite as distâncias para conhecer os parques nacionais do Grand Canyon, de Zion e de Bryce, o Monument Valley, e a cidade de Sedona.
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Guia VT
DE VEGAS PRA LÁ
Não existe ônibus ou trem até Page, e o ideal é ir de carro porque as distâncias entre os passeios são grandes e não há transporte público na cidade. Os persistentes têm a possibilidade de embarcar em um ônibus da Greyhound de Vegas para Flagstaff e de lá contratar um tour com a agência Explore Arizona Tours, que organiza passeios para o Antelope de abril a outubro.
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COMO CIRCULAR
De Page até Horseshoe Bend é possível contratar um táxi pelo +1-928-645-2789.
Ficar
O Lake Powell Resort organiza passeios de barco.
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